REFLEXÕES - Quando as coisas dão errado...

Em tempos de vírus vale a pena buscar algo mais suave para desanuviar o espírito e deixar o corpo mais leve.



Muitos devem lembrar dessa imagem que "viralizou", no bom sentido, tempos atrás. A "restauração" realizada numa igreja da Espanha por uma senhora octogenária, resultou em perda total. Por outro lado, a ampla divulgação que o fato teve nas redes sociais deixou a igreja famosa e o acesso ao mural conquistou mais visitantes. Embora se trate de algo sério não se pode negar que tais condutas levam ao contexto do humor, negro ou não, nos proporciona momentos de descontração para curtirmos algo que, na maioria das vezes, tratamos como muito respeito.

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Ecce Hommo, como era, como estava e como ficou.
Pelo bem do patrimônio não convém deixar que pessoas dadivosas e amadoras façam restaurações espontâneas, pois os resultados podem ser terríveis.
O campo da Restauração Artística é um dos mais complexos e mais importantes quando se fala em preservação de Obras de Arte, logo, serviços nessa área devem ficar a cargo de especialistas e não de colaboradores eventuais.

Este caso não foi o primeiro e, lamentavelmente, não será o último, os pretensos restauradores estão de plantão, à espreita e prontos para fazerem uma lambança geral, a "criatividade" desse pessoal não tem limites.

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Outra "restauração": São Jorge a cavalo, em Navarra na Espanha.

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A Espanha parece ser a vítima preferencial de restauradores amadores, esse também foi uma tentativa espontânea de realizar a revitalização de algumas esculturas medievais.

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Três esculturas de madeira do eremitério da cidade de El Rañadoiro, Astúrias, Espanha.
O conjunto das três imagens "restauradas".

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Ainda na Espanha um São José e uma Santa Maria Egípcia colocadas em um santuário de Setefilla, também provocam lamentos:

O tamanho de San José, antes e depois da intervenção.
São José antes e depois recolorido...

A imagem de Santa María Egipciaca antes e depois da restauração.
Santa Maria, banhada e re-vestida...

O Brasil não está isento desses desastres, a imagem de Santa Bárbara, realizada no século XIX, da capela de Santa Cruz da Barra na Fortaleza de Santa Cruz também passou por isso:
A estátua de Santa Bárbara na Capela Santa Cruz da Barra, antes e depois da restauração.  Foto de Milton Teixeira.
Santa Bárbara de Santa Cruz da Barra.
A estátua de Santa Bárbara na Capela Santa Cruz da Barra, antes e depois da restauração.  Foto de Milton Teixeira.
Percebe-se a transformação radical...

Como se percebe ninguém está livre disso, até Buda sofreu um upgradevisual, uma super transformação:

O Anyue Buddha antes e depois da restauração.  Foto de Xu Xin, via Weibo.
Buda numa gruta de Anyue, na China, imagem com mais de 1.000 anos, "restaurada".
Ainda na China, o resultado da reciclagem de um afresco também mostra uma "atualização" das cores:

Um dos antigos afrescos budistas no Templo Yunjie, em Chaoyang, nordeste da China, que agora foi coberto por pinturas de desenhos animados como parte de uma "restauração".  Foto cedida por STR / AFP / Getty Images
Afrescos Budistas em Chaoyang, na China, realizados entre 907-1125, antes e depois.

Talvez uma das mais ridículas tentativas de restauração tenha sido a reconstrução da cabeça do menino Jesus nos braços de Maria na Igreja de Sainte-Anne-des-Pins, em Sudbury, Ontário no Canadá.
Conforme se conta, a cabeça do menino foi decapitada e recolocada várias vezes até que, enfim desapareceu. A substituição foi proposta por uma pessoa da localidade que faria o seviço "de graça", obviamente a cúria concordou imediatamente e o resultado de tal serviço pode ser aqui comprovado:

A tentativa de Heather Wise de restaurar uma estátua de Jesus.  Captura de tela via YouTube, cortesia de Coisas da Net.
Qualquer semelhança com Lisa Simpson é mera coincidência.
Segundo relatos, a cabeça em terracota era apenas temporária enquanto se preparava uma de pedra definitiva, no entanto, a monstruosidade foi parada a tempo. Durante o processo o decapitador arrependido, devolveu a cabeça original e tudo voltou a ser como antes...

Fora a diversão que estas peças mal resolvidas possam provocar, não se deve esquecer que há trabalhos bem sucedidos e que colocam as obras em condições adequadas ou compatíveis com o que propõem. É o caso da pintura de Da Vinci que, durante muito tempo deixou de ser atribuída a ele por conta de restaurações que a alteravam substancialmente e colocaram em dúvida sua autoria.
Mas, depois de várias limpezas a obra voltou ao seu estado original, como se vê na imagem da esquerda, abaixo, inclusive com as rachaduras e ranhuras decorrentes aos danos que sofreu ao longo do tempo. Após esse processo ela foi novamente restaurada, como se vê na imagem da direita e vendida pela Christie´s de NY em 2017 por 430 milhões de dólares.


Antes e Depois da Conservação da Pintura Salvador Mundi
Salvator Mundi, de Leonardo da Vinci, antes e depois da restauração.

Hoje em dia as tecnologias e técnicas de análise, recuperação e restauração de Obras de Arte avançaram muito e é, praticamente, impossível provocar danos às obras submetidas a processos técnicos experientes, acompanhados ou desenvolvidos por especialistas.
As questões de conservação e restauro não se referem apenas às obras do passado, mas também às obras recentes. Muitas obras produzidas a partir do Modernismo são suscetíveis à danos devido às experimentações, proposições eventuais ou transitórias, Isso faz com que sofrem intervenção e interferência de condições ambientais com também a degradação devido à variedade de materiais usados. Muitos artistas trabalham com materiais insólitos, orgânicos, em geral, degradáveis por sua própria natureza. Nesse caso, os restauradores enfrentam problemas de toda ordem: sejam estruturais ou com as matérias com que estas obras foram realizadas. Conservar tais obrar requer domínios que vão da química à física, pois além da tentativa de conservação de materiais originariamente degradáveis, eventualmente elas precisam ser restauradas, o que leva a uma questão completamente nova: repor o material usado originalmente ou deixar que ele siga seu destino e desapareça?

Um exemplo desse tipo de problema ocorreu com uma das obras de Damien Hirst: "A impossibiliadade Físca da Morte na Mente de Algo Vivo de 1991. Encomendada pelo galerista inglês Charles Saatich, pagando por ela 50 mil libras e depois vendida ao investidor americano Steve Cohen.

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A obra realizada na década de 1990, conservada em formol, começou a apresentar sinais de deterioração depois de uns 15 anos. Isso causou extremo desgosto ao colecionador que acionou o artista para resolver a situação, afinal algo que custou 50 mil libras não pode se desmanchar assim.


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Conta a lenda que Hirst se propôs a substituir o tubarão, o que causou também sensação no contexto da Arte, já que a originalidade seria sacrificada em prol do mercantilismo, mas como se trata de Arte Conceitual, admite-se o licenciamento de proposições em detrimento de obras originais.

Enfim, espero que possam sorrir um pouco mais nesses dias tensos, saúde, curtam e compartilhem, conhecimento e diversão podem se juntar... em alguns casos!





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