REFLEXÕES - O que isso quer dizer? Uma aproximação com a leitura da obra de arte visual.

Só para introduzir a postagem: 

Um de meus desenhos à carvão ou poderia dizer também: uma intervenção gestual, gráfico/expressiva, com carvão sobre papel. 
Desenho a carvão, Isaac.
Obras de Arte são criadas em várias poéticas usando vários meios expressivos. Neste caso recorro a um dos meios tradicionais, como o carvão e exploro suas características e qualidades plásticas como sua negrura, seu potencial de aceitar variações tonais indo do preto total, passando por uma infinidade de cinzas. A possibilidade de valorizar e destacar a textura revelada pela superfície em que é aplicado. Suas sutilezas e nuances plásticas, estimulam a criação e motivam a grafia e as tonalizações. Este é o lado da criação, uma espécie de leitura propositiva que orienta uma boa parte da criação artística. Por outro lado, muitas vezes as pessoas não sabem por onde começar a leitura ou melhor, a "descoberta" de uma Obra de Arte. Então vamos lá:

Quando alguém se depara com uma Obra de Arte, especialmente uma destas “modernas”, podemos esperar pela pergunta habitual: O que isso quer dizer? Aí sentimos aquele frio na espinha, um arrepio no corpo e uma vontade imensa de começar de novo, numa área mais amena, quem sabe física quântica? É nesse momento que se coloca em dúvida se a opção pelo ensino de arte foi uma boa escolha. Essa perguntinha capciosa desafia tanto os professores quanto os artistas que, nem sempre, conseguem ter na ponta da língua uma resposta pronta e acabada, tampouco satisfazer a curiosidade do interlocutor.

Na defensiva, a primeira tentação é contra-atacar, sapecar uma resposta tipo: Arte não significa, ela é!  Bela resposta... profunda não? Mas não resolveu nada, o inquisidor ficou na mesma, não aprendeu nada com isso. Para salvar nossa pele, podemos ainda sair pela tangente: Que tal o jogo de ontem? Quem venceu? Brincadeiras à parte, enfrentar a questão, apesar de tudo, ainda é a melhor saída. Para enfrentar com dignidade e galhardia esta pergunta, podemos recorrer a alguma estratégia, alguma chave de leitura, um modo, um meio, algum tipo de procedimento que facilite a aproximação com a obra de arte, uma abordagem que possibilite a apreensão dos sentidos propostos por ela.

A princípio precisamos entender que não existem fórmulas mágicas, em se tratando de arte visual, nosso acesso é feito necessariamente pela imagem, logo, esse primeiro acesso é da ordem do perceptivo, não há como ignorar isso. Podemos dizer, nesse caso, que a leitura é mediada pelo olhar, mas devemos esclarecer que esse olhar não é apenas uma decorrência do ato de ver, do enxergar, da pura percepção visual, é muito mais do que isso. É necessário saber olhar, esse é o ponto principal dessa discussão.

Mas, afinal, em que consiste esse saber olhar? De imediato podemos dizer que há uma espécie de educação do olhar que começa pela apreensão das qualidades sensíveis do mundo natural, mediante a fisiologia do simples enxergar até o ordenamento consistente, sistematizado e conseqüente desse olhar especializado-o a ponto de torná-lo um instrumento de trabalho. Este olhar implica numa atitude consciente e sistemática diante da Obra de Arte, que se estende além da apreensão sensível, isso requer o ordenamento de condutas e procedimentos que possam nos amparar, orientar e indicar caminhos que resultem na apreensão de valores, idéias e conceitos que se originam na obra de arte.

Tudo isso depende de um aprendizado específico. Essa educação do olhar nada mais é do que aquilo que chamamos de leitura e, nesse campo, de leitura estética que é, em última instância um modo de aproximação com as Obras de Arte. Entendemos a arte como a manifestação estética orientada mediante as diferentes poéticas que a humanidade criou ao longo do tempo, expressando seus valores mediante diferentes modalidades expressivas. Essas modalidades, ao serem operadas, produzem Obras de Arte e, cada uma delas se constitui num campo de ação específico, dependente de conceitos, habilidades e domínios próprios, cujos métodos, técnicas, substâncias e materiais são operados por cada uma delas.

Podemos aceitar que cada uma opere segundo uma estrutura própria, chamada de Poética, admitindo que há, em cada elemento constitutivo daquelas modalidades, essências e valores passíveis de serem constituídos em sentido, gerando significados. Mesmo que a Arte Visual seja a mantenedora de um dos meios de registro dos mais antigos da humanidade e ainda, um dos modos de interação e comunicação mais eficientes da sociedade em todas as épocas, ela não é redutível a um sistema convencional e padronizado de signos como o verbal.

Ao falarmos de pintura, por exemplo, estamos falando de algo simbólico ou imaterial e que remonta à pré-história, portanto, há uma tradição pictórica que ampara o próprio fazer. Assim, ao falarmos de leitura de Obras de Arte, devemos levar em conta que só podemos analisá-la mediante sua manifestação, por meio de sua presença na relação com quem a lê e no contexto e no tempo em que se encontra sem fazer parte do "espírito da época" em que foi criada. Outro aspecto que é necessário considerar é que a arte é uma manifestação volitiva, intencional, logo, é algo que emana de um querer e de um poder fazer que resultará num produto formal gerador de sentido. Isto é feito dentro de um sistema social e cultural que interage, queiramos ou não, com a produção das Obras de Arte e ainda de acordo com o artista que a produziu em sua época e seu lugar.

Presença e leitura em Arte Visual
Necessariamente o que nos atrai para a obra de Arte Visual é a sua presença, sua configuração/constituição imagético/espacial, suas qualidades sensíveis e plásticas percebidas, apropriadas, traduzidas ou simplesmente acessadas pelo "leitor". 
Sua presença e aparência dará as pistas sobre ela, seus sentidos, significados e funções "brotam" dela. São seus modos de ser e de estar no mundo que fazem com que signifique e faça sentido.
Na medida em que descobrimos e acionamos os meios e modos através dos quais elas são constituídas para produzir significação é que nos transformamos em leitores e, simultaneamente, seus co-autores ou reconstrutores.
Uma obra de arte só pode ser compreendida se pudermos reconstruir suas bases significativas, desde suas estruturas constitutivas até suas relações estéticas e sociais. Entender o caminho que ela percorreu até nós é também um modo de conhecer. É necessário considerar que, em relação às obras do passado, há que se considerar a transposição espaço/temporal para que possa compreender melhor as estratégias expressivas e de sentido.que foram acionados na sua realização e, assim, compreendê-la melhor.
Uma leitura histórica depende da capacidade de compreender o contexto em elas surgiram, de reconstruir seu percurso temporal e geográfico de sua criação até hoje. Esta tem sido a tarefa da História da Arte como também a da Sociologia da Arte. Compreende-la mediante sua situação histórica já é, sem dúvida, uma boa parte do que podemos considerar enquanto produção de sentido, pois é justamente a possibilidade de rastrear seus objetos, suas manifestações e monumentos, ao longo do tempo e dos lugares, dão acesso e revelam seu significado social.

Por outro lado, não podemos também perder de vista que a Obra de Arte, para existir, depende de um fazer, da organização de habilidades, instrumentos, meios e materiais para sua realização, logo, há componentes estéticos relevantes para sua compreensão, inclusive de estilo, tanto em relação a pessoa que a produziu, quanto ao período no qual foi realizada. Do mesmo modo, há que se considerar também os motivos que a geraram, se foi produzida ou orientada para o cumprimento de funções pragmáticas, simbólicas, culturais ou sociais.
Pode-se dizer, grosso modo, que a Obra de Arte é uma instância geradora de informação e que, boa parte dessa informação, pode ser obtida de sua presença e configuração. Enfim, as obras contém e mantém dados relativos à sua produção como também podem dar pistas, evocar ou revelar as condicionantes sociais de sua realização.

Até aqui apresentei questões gerais à respeito de possíveis abordagens de leitura de Obras de Arte Visual, contudo, ainda não "tirei o coelho da cartola", ou seja, aquele momento surpreendente em que o mágico faz surgir do "nada" um coelho...
Pensando pedagogicamente, que é minha sina e função, posso dizer que para "Ler" ou apreciar uma obra de Arte Visual é necessário adotar uma estratégia. 

Ao longo do tempo vários estudiosos, teóricos da Arte ou não, propuseram ou adotaram meios de análise e apreciação de obras segundo diferentes interesses e posturas, todos vinculados ao "espírito de seu tempo", ou seja, o que servia para eles, necessariamente, não serve para nós, embora, em termos de conhecimento, sejam essenciais para auxiliar-nos para a compreensão do todo. 
Posso antecipar que há muitas abordagens e, mesmo assim, ainda restam dúvidas sobre qual seria a melhor ou mais adequada delas. Obviamente, há aquelas que correspondem melhor a cada tempo e lugar, precisamos apenas escolher ou adotar a que melhor atende aos nossos interesses de conhecimento e correspondam ao que vemos e temos hoje.
Uma primeira questão que vale a pena destacar é o campo de abordagem do pensamento, leitura, apreciação e mesmo a crítica  sobre as Obras de Arte Visual, já que a maioria dos escritos sobre Arte se referem às manifestações visuais.

O primeiro e talvez o mais recorrente deles surgiu na Antiguidade, o da Filosofia. Por que digo isso? Simplesmente porque os primeiros leitores/apreciadores/comentadores foram os filósofos da antiga Grécia. Esses caras se metiam em tudo, não há, praticamente, nenhum campo do conhecimento que algum grego antigo não tenha colocado o bedelho.

Para alguns filósofos gregos, a questão da Arte estava diretamente vinculada à questão dos Valores: éticos, morais e à verdade, logo, não se referia a nenhum valor material. É o caso de Platão que considerava a Arte como uma manifestação Idealizada em busca de uma perfeição imaterial que se encontrava fora da natureza, no Mundo das Ideias: ao Bem como conduta moral correspondia ao Belo como conduta estética. Logo, encontrar essa perfeição era uma meta tanto do artista quanto do filósofo. Aristóteles, seu discípulo discorda e coloca a Arte no mundo natural e atribui ao artista a responsabilidade de operar a materialidade em busca de valores tangíveis pela aparência como a harmonia, o equilíbrio, a ordem e a simetria. Percebam então que para Platão o conceito de Belo era idealizado e para Aristóteles era vinculado à aparência.

No Medievo, os maiores estudiosos das manifestações artísticas foram os filósofos cristãos como Santo Agostinho e São Tomás de Aquino, logo, a visão que tinham, não era necessariamente do mundo laico, mas sim religioso. Assim, para Santo Agostinho, a Arte devia representar valores como: Integridade ou Perfeição; Proporção ou Harmonia e Claridade ou Luminosidade. Para ele a beleza era, juntamente com a verdade e a moral, atributos divinos, logo, a Arte devia refleti-los, pensamento muito parecido com o de Platão. Para São Tomás de Aquino, a percepção de Belo se aproxima de Aristóteles ao admitir que o Belo é gerado pela apreciação do que nos parece agradável, portanto, há um pouco menos de “divindade” e mais materialidade em sua visão. 

O período Moderno vê surgir, no século XVIII, um dos pensadores mais lembrados por se dedicar a desvendar o valor da Arte por meio do Belo: Emmanuel Kant, filósofo alemão, vai dizer que o Belo é gerado pela sensação que causa o sentimento de prazer ou desprazer diante de algo, mas ao mesmo tempo diz que tal sensação não é objetiva, mas subjetiva, gerada pela imaginação da pessoa e não na Obra de Arte. Diz então que o Belo se refere ao juízo de Gosto, ou seja, se alguém gosta de uma obra é suscetível ao prazer. Há sensações paralelas e parecidas como gracioso, encantador e deleitável que constituem algo sublime. Nesse sentido, para ele, parece haver uma espécie de gosto universal que une todas as pessoas e assim o que é belo para um é também belo para outro, portanto, descartaria a individualidade e a subjetividade. Enfim, este era o modo como ele explicava a apreciação artística.

Ainda nesse tempo, George Hegel e depois Alexander Gotlieb Baumgarten, também alemães, vão considerar que a apreensão Estética se baseia na apreensão sensível, na Estesia e, a partir daí se constitui um processo de percepção dos valores nas Obras de Arte. Em 1750, Baumgarten edita o livro: Estética como ciência do belo e da Arte, assim o que era Filosofia, se torna Estética. Constituindo, então, o campo preferencial de abordagem da apreciação, conhecimento e estudo das manifestações artísticas desde então.

Embora o campo da Filosofia/Estética tenha tradição e respeito na comunidade de estudiosos da Arte, outros autores, de outros campos, passaram a abordar a Arte segundo outros critérios ou métodos.

Na transição do século XIX e XX, um dos autores que trará mais objetividade ao contexto da Historiografia da Arte é Heinrich Wolfflin, fundador da Teoria da Visibilidade Pura. Note-se que não falei agora em História, mas sim Historiografia. Vale esclarecer que a História se refere ao percurso no tempo e espaço de ocorrências e acontecimentos descritos, narrados pelos documentos tradicionais e a Historiografia se dedica, principalmente, aos próprios documentos como fontes primárias, no caso da História da Arte, se dedica às Obras de Arte como fonte de pesquisa e base de análise.

Para Wolfflin, as Obras de Arte devem ser analisadas a partir de sua configuração formal. A aparência e estilo que denotam, a maneira como revelam, por meio de sua organização estética, os sentidos e significações. Analisa as obras a partir de sua estrutura constitutiva, sua expressão/manifestação visual. Um de seus principais trabalhos é o que desenvolve na análise comparativa entre o Renascimento e o Barroco no qual define, em síntese, que o Renascimento é o triunfo do desenho, da racionalidade e o Barroco o triunfo da cor e da emotividade. Nesse sentido descarta as questões sociais como fonte de estudo e investe numa análise dos estilos.

Esta é uma grande mudança, corresponde também às mudanças que vão acontecer no contexto da produção artística como o advento da Modernidade que começa a se mostrar no século XIX e XX. 
Outra iniciativa, esta de caráter cultural, foi a criação do Instituto Warburg, por Aby Warburg em 1933, que investe até hoje em estudos sobre arte, etnografia, antropologia de modo interdisciplinar no intuito de analisar como a construção de imagens estão inter-relacionadas aos outros meios de conhecimento humanos. Estuda não só a aparência, o estilo, como queria Wolfflin, mas as questões de ordem simbólicas e místicas como fontes e conhecimento da história humana organizadas por Warburg em categorias como: Ação, Orientação, Palavra e Imagem.

Boa parte dos estudos oriundos do projeto de Warburg continuou por meio do trabalho dos pesquisadores que desenvolveram métodos de abordagem Formalistas ou Iconológicos para realização de seus estudos, alguns deles são: Ernest Cassirer, Ernest Gombrich e Erwin Panofsky. Foi Panofsky quem instituiu a abordagem Iconológica e Iconográfica: definiu a iconografia como estudo do tema ou assunto e a iconologia como o estudo de seu significado, sem dúvida um das melhores metodologias para os estudos em Arte Visual desde então. Em 1939 publica o livro: Estudos em Iconologia.

Nele estabelece três níveis de abordagem de uma Obra de Arte: Primário, aparente ou natural, no qual a obra é apreendida por meio de suas formas, assunto e aparência diretos; Secundário ou convencional, relacionado à cultura e à iconografia simbólica instaurada na sociedade; Significado Intrínseco ou conteúdo, considera os aspectos iconológicos, a configuração da obra em função dos aspectos técnicos, históricos, culturais fruto do ambiente social na qual ela surge. Este método é entendido como Formalista ou Iconológico no qual a análise parte da apreensão sensível da obra, sua configuração estrutural, até seus significados e conteúdos internos. É um dos procedimentos mais eficientes para análise da Arte Visual devido à abrangência e potencial.

Este é o método ao qual mais recorro, justamente por possibilitar o trabalho em diferentes níveis sem que um dependa necessariamente do outro, ou seja, não é necessário trabalhar os três níveis sucessivamente, pode-se optar pelo abordagem em cada um deles isoladamente, em função do que se quer apreender em relação a uma ou outra obra. Obras de caráter abstrato, podem ser analisadas no primeiro nível, enquanto que obras de caráter figurativo podem ser analisadas no segundo nível e ambas podem ser analisadas no terceiro nível.

Nessa linha de raciocínio me inspirei no método “Pnofskyano” e estabeleci um procedimento que considera apenas dois níveis, com vista a facilitar a abordagem: Perceptivo e Relacional.


Assim, o primeiro modo de aproximação considera  a apreensão direta, sob o aspecto perceptivo, dependente das qualidades sensíveis do mundo: Luminosidade (valores qualitativos da luz como intensidade e frequência), Espacialidade (valores espaciais como direções e dimensões) e Temporalidade (valores como deslocamento e distâncias) que, nas obras de arte visual são convertidos em qualidades plásticas e visuais como formas, cores, texturas etc. Estes elementos são, singularmente, referenciados ao mundo natural fenomenológico e capazes de produzir um rápido reconhecimento e imediata interpretação daquilo que estas obras apresentam como cor e forma, por exemplo. Além disso, podem manifestar idéias, valores, interesses, assuntos e temas dos quais as obras venham a se ocupar. 

Se, por um lado, é possível observar as qualidades sensíveis que a obra revela, por outro, é possível também identificar as coisas como são no mundo: pessoas, objetos, animais etc., enfim, tudo aquilo que é possível reconhecer pelo simples olhar, pela apreensão sensível é resultado desta relação imediata e estésica, ou seja, de uma Leitura Perceptual. Esta seria então, nossa primeira aproximação cognitiva com a obra, não é a única vertente de leitura, mas já é um bom começo. 
A partir de uma aproximação imediata pode-se empreender uma abordagem mediata ou Relacional,, ou seja, de relações e intermediações.

Se num primeiro momento já obtivemos diversos dados, qualitativos e temáticos, essa nova aproximação parte do pressuposto de que os valores e conceitos que amparam as Obras de Arte não são apenas da ordem do perceptivo, mas de diversas ordens cognitivas. Devemos trabalhar não só com o que é possível constatar do que vemos e observamos, mas também com relações inferenciais e dedutivas, uma Leitura Relacional. Faz-se, portanto, necessário destacar que, nesse segundo momento, a aproximação depende de uma análise mais acurada, ou seja, do entendimento de que as obras de arte, além de viverem das suas formas e configurações intrínsecas à sua própria índole, vivem também da relação dos elementos que são extrínsecos a ela no contexto social e cultural nos quais existe e com os quais dialoga.

Nesse caso, estaremos contrapondo à leitura estésica preliminar, uma segunda leitura pode se iniciar a partir de sua imagem relacionando-a com os demais conhecimentos histórico/artísticos e estéticos que lhe são específicos, ou seja, aqueles que posicionam a Arte na cultura como um meio de apresentar o mundo e de estar no mundo promovendo Análises Comparativas. Assim, as obras, além de serem vistas por suas qualidades e pelas propriedades sensíveis são, ao mesmo tempo, vistas pelo que elas significam no contexto sócio/cultural, é desse modo que são estabelecidas as relações com seus autores, estilos, escolas, movimentos e demais características que as colocam num patamar de leitura interdisciplinar.


As duas imagens que vemos trazem características plásticas e temáticas diferentes. A da esquerda é de Leonardo da Vinci, a famosa e inconfundível Mona Lisa, de 1503, e a da direita de Picasso, Mulher chorando, de 1937. São duas imagens figurativas, embora realizadas de modos completamente diferentes, tomam um mesmo tema: uma figura feminina.
Leonardo nos mostra uma mulher que posa e olha discreta e diretamente para o espaço que se desdobra diante dela. 

Podemos reconhecer nela a figura humana e a paisagem, a aparência geral da imagem tende ao naturalismo. Os elementos plásticos são organizados dentro de uma projeção visual ótica de tal modo que nada possa ser confundido, misturado ou complicado e a maneira de fazer a pintura também não nos estranha, já que a imagem se parece com o que estamos habituados a ver num retrato: alguém, em primeiro plano, que posa diante de um cenário que nos olha e se dá a ver. 
A imagem de Picasso é também um retrato feminino, uma pessoa também em primeiro plano. Nesse caso a configuração visual da imagem não corresponde ao que estamos habituados a ver no mundo natural. A imagem se quebra, deforma, distorce, no entanto, a figura revela tensão e esta tensão é mostrada pela forma como a imagem foi criada. As quebras, cortes e deformações tendem a produzir uma sensação de mal estar. O choro revelado por linhas, estrias, que caminham dos "olhos" escorrendo pela face emula o sofrimento. Mas não são só as lágrimas, são os fragmentos, os cortes rígidos e angulares que ocupam a imagem e a desmancham e contorcem numa desfiguração tensa. O modo fragmentário da obra gera tensão emocional. 
Comparando as duas podemos dizer que a de Da Vinci é mais contemplativa e a de Picasso nos parece mais afetiva na medida em que requer uma participação maior de análise para a compreensão do todo. 
Se tomarmos o percurso das questões históricas vamos recuperar informações das poéticas que ampararam o Renascimento Italiano e do Cubismo.Vamos descobrir que cada um desses momentos artísticos propunha modos de compreender e revelar o mundo e, conseqüentemente, modos diferentes de produzir sentido e significação embora as duas sejam Obras de Arte relevantes no contexto histórico, cada uma tem sua própria história... 

Mas essa é uma outra história..
Agradeço a leitura e o compartilhamento.

2 comentários:

Raphael Alves disse...

Professor, da minha condição de leigo no assunto, eu diria, humildemente, que a resposta para "O que isso quer dizer?" está em cada um de nós. Lembro de sua primeira aula, na qual nos disse que as imagens existem em nós...
Certa vez, escrevi um texo "Causos, cousas e um comentário sobre Clapton" e uma penca de pessoas me perguntava o que eu quis dizer. Respondi com outro texto (ambos estão no blog) chama "Não me pergunte porque eu também não sei a resposta...". Acho que é isso: nossa "bagagem cultural" é que define o que enxergamos em uma obra, seja escrita, visual, ou até o que sentimos ao ouvir uma música...

delivia disse...

Muito interessante, na verdade sabemos as respostas, só não sabemos, as vezes, transmiti-las para as outras pessoas.