REFLEXÕES - A Banana e a Arte: uma relação escorregadia...

Banana é Arte? Ou uma banana para a Arte?

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Maurizio Cattelan, artista italiano contemporâneo, apresentou uma Obra de Arte na última Art Basel Miami, agora em 2019, que foi vendida por U$ 120.000,00, em nosso pobre dinheiro, aproximadamente R$500.000,00. Esta é uma notícia que, com certeza, causa estranhamento em muitas pessoas, até em nós que estamos habituados aos percursos inusitados da Arte na contemporaneidade.

A obra, sugestivamente chamada de "Comediante", foi apresentada pela galeria Perrotin, de Paris, que representa o artista. Segundo o proprietário da galeria, há três edições da obra, das quais duas já foram vendidas. Cada uma delas é constituída de: Uma Banana, (ao que me parece Nanica), fixada na parede com uma faixa de fita adesiva prata (posso dizer que a fita é realmente eficiente, já a usei algumas vezes e sei de esqueitistas que a usam para reformar seus tênis esfolados, bem como de outras pessoas que recorrem a ela para fixar as mais diversas coisas com segurança), desculpem-me a ironia, mas não resisti.

Voltando ao assunto e falando sério, temos que observar o contexto, ou seja, como algo como uma banana, se torna Obra de Arte. Primeiro é necessário entender que: a Obra de Arte não é a banana!
Falando assim, parece que ao contrário de esclarecer estou complicando a coisa, mas é isso mesmo.
Quando Marcel Duchamp, o pai de todos esses artistas que se apropriam de coisas e objetos do cotidiano e, por atribuição, os colocam no contexto da Arte, se apropriou de um mictório masculino, o colocou em situação expositiva num evento de Arte e o batizou de "A Fonte", estabeleceu o procedimento apropriativo que chamou de Ready Made, ou já pronto. Um de seus comportamentos criativos era se apropriar de objetos encontrados (objet trouvé) e atribuir-lhes o estatuto ou a dimensão de arte inserindo-os no ambiente ou circuito de Arte.


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Marcel Duchamp, "Fontain", 1917.
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Marcel Duchamp, "Garrafeiro", 1914.Uma estrutura de metal usada originariamente para secar garrafas.

Nesse sentido, vale a pena refletir sobre as atitudes de Cattelan observando algumas de suas obras, assim podemos avaliar melhor a situação da Banana:

Maurizio Cattelan, "La Nona Ora", 2016, Papa Paulo VI atingido por um meteorito.
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Maurizio Cattelan, "L.O.V.E." (acrônimo de liberdade, ódio, vingança e eternidade), 2010. Escultura exposta defronte a bolsa de valores de Milão 
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Maurizio Cattelan, "América", 2016. Peça realizada em ouro 18k. avaliada em cinco milhões de dólares. Foi mostrada pela primeira vez no museu Guggenheim de Nova York. Estava expostas no Palácio de Blenheim, de onde foi roubada dois dias após a abertura da mostra o que provocou o alagamento do ambiente expositivo pois, a peça era instalada para cumprir sua função original e estava disponível para os visitantes. Até hoje nem a obra tampouco os autores do roubo foram encontrados...

Olhando para estas peças também é possível dizer que não são elas propriamente que se tornam Obras de Arte, mas a proposição que as institui ou leva o espectador a apreciá-las no contexto da Arte justamente por terem sido lá colocadas por alguém. Esse alguém no caso foi Duchamp que ironizou e escarneceu o Sistema de Arte vigente no seu tempo, como ainda hoje fazem muitos artistas, é o caso de Catellan, um dos que usam o senso de humor, a sátira e o non-sense para realizar suas obras. Nessa linha de raciocínio, o estranhamento é um comportamento previsto e esperado em relação a este tipo de obra.

Enfim, acredito que agora seja possível esclarecer melhor o caso da "Banana Cattelana". As proposições de Cattelan são irônicas, polêmicas e desafiam tanto o senso comum quanto a lógica dominante do mercado de Arte e da sociedade, assim, não é de estranhar que "desse uma Banana" para o mercado de Arte, especialmente numa mostra do tipo da Art Basel, que se tornou um dos modelos mais emblemáticos nos dias atuais: as grandes feiras de arte. O irônico é que o establishment revidou e adquiriu a obra provando, mais uma vez, que a grana sempre vence.

Cabe esclarecer ainda que esse tipo de obra não é adquirida em sua forma original, ou seja: de uma banana colada com fita numa parede, a questão mais banal é que a banana irá apodrecer em poucos dias, nesse sentido talvez não valha a pena gastar milhares de dólares numa banana que pode ser adquirida por alguns centavos em qualquer mercado. Então, a pergunta que não quer calar é: Porquê, porquê?

Bem, as obras de caráter propositivo ou instalações normalmente são acompanhadas de instruções detalhadas para sua instalação. Assim, mesmo que uma dessas obras seja "impermanente", transitória, o autor autoriza o adquirente a realizar instalações da mesma quando lhe aprouver, replicando-a com novos materiais se for o caso, logo, o que se compra não é a obra mas sim o direito à sua posse e apresentação. Ou seja é um Titulo de Propriedade ou de Ação ao Portador em que se aposta na valorização do papel como qualquer outro investimento. 
Quanto mais famoso, celebrado, conhecido for o autor, maior será a possibilidade de que os milhares de dólares aplicados nesse momento, se tornem milhões no futuro... 
Enfim, fico pensando se os bananas não somos nós...

Espero ter desembananado a questão, agradeço a leitura e o compartilhamento, obrigado. 

Um comentário:

marco fabiani disse...

Oi Isaac, aqui é o Marco Fabiani. Li e principalmente vi seu blog. Sempre espero coisas interessantes de você, claro. Mas esse blog foi muito além! Estou maravilhado!Parabéns. Vou seguir e passar para a Denise.
Grande abraço